Professores e estudantes da rede pública de ensino pedem que governador negocie.
De longe já dava para escutar o barulho de apitos, palavras de protestos e pés que marchavam rumo a mais uma tentativa de negociação. A manhã desta quarta-feira (21) não foi rara para contingente de servidores que desde o dia 5 de agosto tenta fazer com que o Governo do Ceará cumpra com a lei que criou o piso salarial da educação. Rostos e corpos pintados, camisas que pedem respeito, fantasias de repúdio, faixas, cartazes e até mesmo um caixão.
O grupo começou a se reunir na Praça da Imprensa, no Bairro Dionísio Torres, e seguiu a pé até chegar à Assembleia Legislativa do Estado do Ceará. Durante a breve caminhada, o grupo ostentava faixas com os seguintes dizeres: “Não abrimos mão da lei do piso na atual carreira”; “Cid quer afogar a educação pública no aquário”; “Todos abraçando a educação”; “Luta pela educação pública”; “Cid Gomes, o exterminador da carreira do professor”.
O trânsito estava paralisado já que a multidão de 5 mil pessoas tomara as ruas. Surpreendente para quem vive nesta capital: os motoristas nada diziam diante do cortejo que passava. Digo que a reação chega a surpreender porque, ao contrário do que acontece diante de manifestações, os cidadãos aparentemente alheios à situação do grupo, não demonstravam irritação, nem consternação, não se ouvia nenhuma palavra do tipo: “Vai trabalhar, vagabundo!”.
No dia 7 de setembro, dia em que se comemora a independência do Brasil, esse mesmo grupo tentou ser ouvido pelas autoridades locais que estavam acompanhando os desfiles na avenida Beira-Mar. A professora Ademilze, que trabalha na Escola Estadual Adauto Bezerra, diz que durante a passeata do 7 de setembro foi chamada de vagabunda por um militar reformado. Ela diz não lamentar a ofensa, pois, para a professora, o que importa mesmo é a luta para que ela e os outros docentes consigam chamar a atenção da sociedade para a precária condição em que trabalham e fazer cumprir a Lei Nacional do Piso Salarial. Do mesmo jeito que levantava a voz para exigir justiça na Beira-Mar, a “tia Ademilze”, como é conhecida entre seus alunos, também se erguia entre as torres das televisões da Dionísio Torres.
Quando os manifestantes chegaram à Assembleia, logo as escadarias e pisos foram tomados. Para impedir que a multidão entrasse no plenário, o policiamento fez uma barreira humana na entrada do local. Mesmo assim, os professores não desanimaram. Em toda a Assembleia Legislativa o coro de “Cid, a culpa é sua”, era ouvido por toda a parte. Eis que, em determinado momento, surge “Cid Gomes”. Dentro de um terno cinza, de gravata e com uma cabeça proporcionalmente maior que o normal, lá estava o governador que tentava a muito custo responder às perguntas dos professores e, ao mesmo tempo, aos repórteres que lá se encontravam.
Entre os gritos de “Professor já trabalha por amor”, os educadores protestavam contra a frase proferida pelo governador Cid Gomes que afirmou, durante um seminário em Natal, no Rio Grande do Norte, que “quem quer dar aula faz isso por gosto e não por salário”. De repente, todos começaram a se ajoelhar e entoaram uma oração diante de um pequeno caixão todo pintado de preto e ornado com flores brancas e papel higiênico. O professor que segurava o símbolo que, para ele e os demais representava a morte da educação, disse, indignado, que o papel higiênico definia o salário que ganhava: “nosso salário não vale nada”.
APEOC desencoraja luta
Arivaldo Freitas, professor da Escola de Ensino Fundamental e Médio Integrada 2 de Maio, estava com uma camiseta com as seguintes palavras: “Senhor (a) parlamentar não permita que destruam a carreira dos professores do Estado”. Com ar melancólico, Arivaldo diz que os professores têm medo de voltar às salas de aula com a moral baixa. Segundo ele, seria difícil explicar para os alunos que no Brasil pós-Ditadura Militar os direitos garantidos por lei ainda estão longe de serem cumpridos. Completa dizendo que a manifestação de hoje tem o objetivo de “arrancar qualquer coisa”, já que o governador se recusa a negociar. O professor também se mostra desapontado com o Sindicato dos Professores do Estado do Ceará (APEOC). Desde que a greve dos docentes foi decretada ilegal pelo desembargador Emanuel Leite Albuquerque, no dia 26 de agosto, o sindicato da categoria vem pedindo aos manifestantes que voltem para as escolas.
Essa mesma decepção é percebida na fala do também professor Sidney de Oliveira Araújo. De acordo com ele, o sindicato só apoiou a greve porque estava bastante desgastado e sofria com a desconfiança dos professores. A greve, segundo Sidney, serviu para que o sindicato, que atualmente tem a presidência de Anízio Melo, não chegasse ao fim.
Nas manifestações anteriores, podia-se perceber cerca de 12 mil participantes. Hoje, no entanto, no máximo 5 mil pessoas foram às ruas e ocuparam a Assembleia. Arivaldo e Sidney não destoam um do outro no momento de explicar o motivo da dispersão: para ambos, o sindicato dos professores se acovardou diante da multa imposta pela justiça que determinou a suspensão da greve sob pena de multa diária de R$ 10 mil, em caso de descumprimento. Com isso, a dívida dos docentes por desobediência chega hoje a mais de R$ 160 mil.
Estudantes
Para quem pensa que essa é uma batalha só de professores, muito se engana. Durante todas as manifestações já realizadas, muitos alunos também compareceram para apoiar e amparar seus mestres.
É o caso, por exemplo, de Arthur Freitas que cursa o 2º ano do ensino médio na Escola Adauto Bezerra. Arthur fez questão de ir à manifestação usando o uniforme de sua escola. Segundo ele, para mostrar apóio aos docentes e dizer que os alunos do Adauto Bezerra aprovam a greve. O garoto diz com convicção que a grande maioria dos estudantes acredita que é justo que os professores estejam paralisando as aulas para buscarem seus direitos.
Antes de decretarem a greve, os professores da escola de Arthur organizaram uma palestra com os alunos e explicaram os motivos que os levaram a tomar tal atitude. Quanto aos pais, Arthur explica que eles também apóiam os educadores, a prova disso, ele afirma, é que foram os próprios pais que o trouxeram para participar da manifestação.
Já as estudantes Marília Marques e Thaís Ribeiro, também no 2º ano da Escola Adauto Bezerra, têm o sonho de se tornarem professoras. Para as meninas, essa não é uma luta apenas dos que já educam nas salas de aulas e que ambas aprenderam a admirar, mas é, principalmente, pela melhoria do ensino público no Estado. As alunas dizem que as exigências dos professores é mais do que justa e pedem para que o governador deixe de querer dialogar e, sim, iniciar uma negociação concreta a favor do piso para os professores.
Informações via CNEWS.
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