Unidade de
Pronto Atendimento de Quixeramobim (Foto: Alex Pimentel)
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Problemas graves e urgentes são como
batata quente nas mãos do Poder Público brasileiro: o Governo municipal joga
para o estadual, que rebate ao federal, que devolve às esferas locais. A
solução fica no limbo. Assim tem sido em relação às oito Unidades de Pronto
Atendimento (UPAs) finalizadas e abandonadas em municípios do interior do
Ceará, cujos R$ 12.250.000 investidos na construção ficam mais inúteis ao
propósito principal: servir à saúde da população.
De acordo com o Ministério da Saúde
(MS), o Ceará "conta com nove UPAs 24h já com atestado de conclusão
emitido: Acaraú, Barbalha, Boa Viagem, Cascavel, Juazeiro do Norte, Morada
Nova, Quixeramobim, Sobral e Tianguá", mas ainda aguardando
"contratação de pessoal e aquisição dos equipamentos para
funcionamento". A Pasta federal garante que "as unidades já foram
habilitadas e estão com os repasses de incentivo financeiro de investimento
efetuados".
No entanto, a UPA de Sobral, mencionada
pelo Ministério da Saúde "está funcionando normalmente" desde quando
foi inaugurada, no início deste mês, conforme a reportagem comprovou.
R$ 12,2 mi
Foi o valor total investido na construção das oito
UPAs cearenses prontas e fechadas, segundo o Ministério da Saúde
Em agosto do ano passado, o Diário do
Nordeste já havia denunciado o abandono de nove unidades, confirmado pelas
respectivas prefeituras, que alegavam incapacidade financeira para manutenção
dos equipamentos de saúde. Quase um ano depois, o argumento se mantém. A
reportagem verificou que oito das UPAs permanecem como elefantes brancos no
interior: apenas a de Jaguaribe foi inaugurada, no último dia 29 de junho, dois
anos após a conclusão da obra.
Se em Sobral, a situação está
regularizada, a cerca de 110 km de lá, Acaraú vive uma realidade bem distinta:
com construção concluída, segundo o MS, desde 2016, a UPA do Município é, na
verdade, um casarão abandonado. Aparentemente pronto, mas fechado e sem nenhum
equipamento, a única vida que o prédio abrigava, quando a reportagem esteve lá,
era a de um cachorro - testemunha de uma estrutura em deterioração pelo tempo e
o desuso.
Quanto à UPA de Barbalha, o prefeito
Argemiro Sampaio afirmou, em agosto passado, que "não existia
demanda" no Município, que a construção havia sido "um programa eleitoreiro"
e que, a partir de 2019, uma policlínica municipal passaria a funcionar no
local. Até hoje, o equipamento nunca foi instalado, e o prédio segue
abandonado. E por tempo indeterminado, segundo a secretária de Saúde, Pollyanna
Callou. Segundo moradores, a UPA chegou a ser inaugurada, mas nunca funcionou,
e materiais chegaram a ser roubados do local.
134 UPAs
paradas no Brasil. De acordo com o Ministério da
Saúde, mais de 130 Unidades de Pronto Atendimento estão com atestado de
conclusão emitido, mas sem funcionar
Em Boa Viagem, o prédio pronto e
fechado deverá ser utilizado como Unidade Básica de Saúde (UBS) e Centro de
Atenção Psicossocial (Caps). Para isso, de acordo com o secretário de Saúde,
Williams Vaz, o Município aguarda autorização federal. "Precisaríamos de
uma contrapartida muito alta para a UPA funcionar, mas não temos essa condição
financeira. A obra foi realizada na gestão passada. Foram detectadas várias
inconformidades na construção. Um processo administrativo está apurando",
completou.
Problemas
Já em Cascavel, a cerca de 62km de
Fortaleza, a Prefeitura confirma a existência de uma UPA entregue e inativa
desde 2012. Em nota, a gestão informou que o Governo do Estado vai
"doar" os equipamentos necessários ao funcionamento da unidade, que
passa por "obras de reparo necessárias por conta do período que ficou
parada". As verbas para custeio do equipamento, afirma a nota,
"deverão ser obtidas por emendas parlamentares que também estão sendo
viabilizadas".
Em Juazeiro do Norte, o prédio que seria
destinado à UPA no bairro Lagoa Seca foi concluído, mas nunca aberto. Mato e
infiltrações ocupam as áreas externa e interna do equipamento, e itens da
estrutura chegaram a ser roubados. Uma auditoria feita ano passado identificou
vários itens incompatíveis com o projeto e, por isso, a Secretaria de Saúde de
Juazeiro do Norte e a Procuradoria Geral do Município protocolaram Ação Civil
Pública por ato de improbidade administrativa contra as empresas que executaram
a obra. Após solução do imbróglio judicial, sem previsão, a UPA deve ser
convertida em policlínica.
No município de Morada Nova, informa a
secretária de Saúde, Luciana de Almeida Lima, a UPA deverá começar a funcionar
após o atendimento das adequações físicas exigidas pelo Ministério da Saúde. Os
serviços deverão ser concluídos ainda neste semestre e, segundo a titular,
equipamentos clínicos e mobília estão assegurados pelo Governo do Estado.
Situação semelhante é verificada em
Quixeramobim, cuja UPA está pronta e fechada desde 2016. Os móveis e
ferramentas médicas, orçados em R$ 2 milhões, virão do Estado. A Secretaria de
Saúde do Município informou estar em processo de planejamento para ativar a
unidade, o que deve ocorrer no primeiro semestre de 2020.
Em Tianguá, a realidade é igual. A
estrutura da UPA começou a ser construída em novembro de 2013. O prazo de
entrega era de 180 dias. Mas há quase seis anos, a população espera pelos
serviços de saúde que seriam oferecidos pela Unidade de Pronto Atendimento. De
acordo com o prefeito de Tianguá, Jaydson Aguiar, as conversas com o Governo
Estadual e a União para inaugurar a UPA estão avançadas. Segundo ele, na semana
passada, chegou parte dos imóveis para equipar a unidade. Apesar de nunca ter
funcionado, a estrutura vai precisar de reparos. A promessa é inaugurar até o
fim de 2019. Quando estiver em funcionamento, a perspectiva é atender nove mil
pessoas.
Readequação
A Secretaria Estadual da Saúde (Sesa)
afirmou, em nota, que envia o custeio mensal de R$ 85 mil a R$ 250 mil a todas
as 36 UPAs ativas no Ceará, "a depender do porte". Mas como o projeto
de construção é tocado pelos Governos Federal e Municipal, a Pasta estadual só
assume o dever de repasse a partir da inauguração.
Em maio de 2018, o Governo Federal
autorizou estados e municípios a utilizarem a estrutura das UPAs inativas em
outra finalidade na área da saúde (como para UBS e Caps), a fim de que não
perdessem as estruturas já erguidas. Mas, segundo a Pasta, nenhum município
cearense solicitou a readequação. O prazo para solicitação era junho deste ano,
e foi prorrogado para novembro.
Caso não se manifestem, as prefeituras
podem ser obrigadas a devolver o dinheiro gasto pelo Governo Federal nas obras.
"O Ministério da Saúde pode aplicar os dispositivos previstos em portaria
para as situações de irregularidades, como medidas de cancelamento das
propostas e devolução do recurso do incentivo repassado".
A presidente do Conselho das
Secretarias Municipais de Saúde do Ceará (Cosems), Sayonara Cidade (titular da
saúde de Capistrano) confirma que o órgão tem conhecimento de todas as unidades
prontas e fechadas, mas rebate a informação do Ministério da Saúde, ao afirmar
que "todos os municípios citados já solicitaram autorização para utilizar
as UPAs para outra finalidade". "O Ministério sinalizou que não teria
recursos para todos os equipamentos finalizados, então autorizou a readequação.
Alguns prefeitos chegaram a manter UPAs por um ano com recursos próprios, do
tesouro municipal, com ajuda do Estado, mas isso é muito oneroso", declara
Sayonara.
A justificativa para a construção de
UPAs em municípios que não conseguiriam mantê-las, segundo a presidente do
Cosems, é mau planejamento. "Sempre entendemos que existe uma contradição
muito grande, porque as UPAs concorriam com hospitais de urgência e emergência.
Acredito que o Governo Federal liberou unidades acima do que estava orçado. Os
municípios receberam dinheiro para construção, mas não para o custeio. Não
vindo esse recurso, é impossível manter", sentencia.
Em nota, o Ministério da Saúde informa
que "deliberações locais das propostas de Readequação da Rede Física do
SUS antecedem a formalização junto à Pasta federal, podendo, portanto,
existirem processos em construção nos municípios para posterior formalização no
Ministério da Saúde". O órgão reforça, ainda, que "tem feito os
esforços necessários para colocar as unidades de saúde em funcionamento".
Fonte: DN/Regional
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