Um dia depois de o Senado
rejeitar quase a totalidade do projeto de reforma da legislação eleitoral, a
Câmara dos Deputados reabilitou e aprovou o texto-base da medida na noite desta
quarta-feira (18), abandonando alguns das principais medidas que afrouxavam as
regras vigentes.
Ainda assim, permaneceram
pontos que afrouxam as regras e o controle sobre o uso das verbas públicas
pelos partidos, como a liberação para pagamento de multas eleitorais, compra de
sedes partidárias e passagens aéreas até para não filiados.
Haverá ainda nesta quarta a
votação dos chamados "destaques", que são tentativas de alteração de
pontos específicos. Após isso, o projeto segue para sanção ou veto do
presidente Jair Bolsonaro (PSL), que tem até 15 dias úteis para tomar uma
decisão. Para valer nas eleições municipais do ano que vem, qualquer medida tem
que estar em vigor antes de 4 de outubro.
Medidas retiradas
Após uma grande pressão de
entidades da sociedade civil, os deputados concordaram em retirar do projeto
cinco medidas: 1) a que permitia que os 33 partidos usassem qualquer sistema
contábil de prestação de contas disponível no mercado, o que acabava com o sistema
padrão usado pela Justiça Eleitoral, dificultando em muito a transparência e a
fiscalização; 2) a que exigia a prova de dolo, ou seja, de ação consciente e
premeditada, para que houvesse punição sobre maus uso do dinheiro público; 3) a
que permitia correção de problemas na prestação de contas até o seu julgamento;
4) a que adiava em oito meses a prestação de contas eleitorais devida pelos
partidos e 5) a que permitia o uso da verba pública para contratação de
advogados para filiados acusados de corrupção e para interesse "direto e
indireto" das siglas.
Regras mantidas
Apesar dessas supressões, ficou
mantida a permissão da contratação de consultoria contábil e advocatícia para
ações de interesse partidário relacionados exclusivamente ao processo eleitoral,
sem que isso conte para o limite de gastos das campanhas. Pessoas físicas
também poderão bancar esses gastos em valores superiores às doações eleitorais
que podem fazer hoje. Segundo especialistas, isso amplia as brechas ao caixa
dois.
Na parte da fiscalização, o
projeto permite que políticos ficha-suja sejam eleitos, já que seus casos
poderão ser analisados até a data da posse (hoje isso tem que ocorrer no
momento do pedido de registro da candidatura).
O texto tira ainda os partidos
políticos do foco de atenção que Conselho de Controle de Atividades Financeiras
(Coaf) dedica às operações e propostas de operações de pessoas expostas
politicamente, entre outros pontos.
Apoiado pelo presidente da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o texto traz de volta a propaganda partidária
que havia sido extinta em 2017, além da permissão de que os partidos usem verba
pública para pagar impulsionamento na internet.
"Nós respeitamos, não
somos um Poder que não ouve a sociedade", disse Maia, sobre os pontos em
que a Câmara recuou. "A imprensa fez críticas, alguns articulistas
colocaram os pontos, encaminhei aos líderes partidários as preocupações da
sociedade, todas legítimas. (...) Temos convicção do que fizemos, não vamos
fugir daquilo que a gente fez. Entre uma votação e outra a sociedade estuda,
questiona, critica, bate. Bate com força. Às vezes dói, mas é assim a
democracia. Graças a Deus a gente tem quem possa nos criticar nesse país",
acrescentou.
Em carta aberta, mais de 20
entidades da sociedade civil pediram a Maia que barrasse os principais pontos
do projeto. O texto afirma que a proposta representa "um dos maiores
retrocessos dos últimos anos para transparência e integridade do sistema
partidário brasileiro". O documento foi assinado, entre outros, pela Transparência
Partidária, Transparência Brasil, Associação Contas Abertas, Instituto Ethos e
movimentos de renovação na política, como o Acredito e o Livres.
Essa pressão havia levado o
Senado a rejeitar praticamente a integralidade do projeto, na terça-feira.
Ficou apenas o ponto que trata das fontes de financiamento do fundo eleitoral,
sem estipular valor –o que será definido no final do ano, na análise do
Orçamento da União para 2020.
Atualmente, siglas e candidatos
são bancados pelos fundos partidário (que deve distribuir cerca de R$ 928
milhões em 2019) e o eleitoral (que distribuiu R$ 1,7 bilhão na disputa de 2018
e pode ter o valor majorado em 2020). O valor do fundo eleitoral expôs uma
divergência entre Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que
são do mesmo partido e têm, até agora, atuando em sintonia fina no Congresso.
Maia tem defendido que o fundo
mantenha para 2020 o mesmo valor de 2018. Ele argumenta não haver espaço no
Orçamento para mais dinheiro para as campanhas. Alcolumbre manifestou opinião
diversa.
"A eleição passada foi de
27 governadores, 54 senadores, de 513 deputados federais e 1.050 deputados
estaduais. A eleição do ano que vem é de 5.570 prefeitos, 57 mil vereadores.
Defendo coerência. Se os vereadores e os prefeitos não tiverem o apoio dos
partidos necessário para eles fazerem uma campanha com responsabilidade, a
gente acaba criando um caminho para estas pessoas não agirem em suas campanhas
dentro da legislação", afirmou.
Ontem deputados reclamaram, nos
bastidores, de Alcolumbre, afirmando ter havido traição no fato de o Senado ter
cedido às pressões contrárias ao projeto. Já deputados e senadores reclamaram
da postura de Maia de não defender um aumento para o fundo eleitoral em 2020.
POR FOLHAPRESS – Via DN/Politica
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