Dos 184 municípios do Estado, apenas 43 contam, hoje, com instalações que atendem às exigências sanitárias- (Foto: reprodução-DN) |
Considerar a carne que vai à
mesa do consumidor sempre como um produto de boa qualidade pode até ser uma
afirmação natural, mas, em muitas cidades cearenses, essa arguição é colocada à
prova. Isso porque menos de 25% dos municípios do Estado possuem matadouros em
conformidade com o que é preconizado pela Vigilância Sanitária e pelo Conselho
Regional de Medicina Veterinária (CRMV-CE).
A maioria dos municípios
cearenses enfrenta problemas no abate da carne bovina, suína, ovina e caprina.
Em janeiro de 2018 o Blog ACONTECE noticiou que mais de 50 matadouros estavam interditados
e em estado de abandono no Ceará, reveja clicando (aqui). No primeiro semestre deste ano,
o Sistema Verdes Mares noticiou que 96 matadouros estavam fechados ou
interditados no Ceará. Seis meses depois, o quadro apresentou sensível piora.
Hoje, são 99 equipamentos desativados, conforme dados do CRMV.
"O número de abatedouros
interditados é muito elevado", considerou o presidente do Conselho de
Medicina, Célio Pires. Sua preocupação diz respeito à sanidade dos animais
abatidos e a saúde dos consumidores. "Sabemos que nas cidades em que os
abatedouros estão fechados, há carne de moita. Ela é vendida livremente e isso
é um grave risco à população", frisou. Célio acrescenta que o problema tem
se agravado, sobretudo, no Sertão Cearense.
De acordo com as normas
sanitárias, o abate do animal e o manuseio da carne devem ser feitos sem nenhum
contato com o solo. No processo, o animal deve ser colocado em um box de
atordoamento, onde será sacrificado utilizando uma pistola pneumática. Em
seguida, o corpo do animal é guinchado pela perna, através de trilhos aéreos,
por meio dos quais é levado ao tanque de sangria. Todo o manuseio deve ser
realizado a um metro do chão. Quem realiza o corte deve estar com todos os
equipamentos de proteção, de modo a não ter contato direto com a carne,
garantindo a qualidade do alimento.
No entanto, dos 184 municípios
cearenses, apenas 43 dispõem de locais regulares e que contemplam as exigências
legais e sanitárias. Deste universo, dez funcionam por exploração de iniciativa
privada a partir de concessão dos municípios, nove são particulares e os demais
são administrados pela gestão municipal.
Danos
De acordo com o Conselho
Regional de Medicina Veterinária, o consumidor que se alimenta de carnes
abatidas em locais que não seguem as normas da vigilância sanitária, conhecidas
popularmente como "carne de moita", corre o risco de adquirir
aproximadamente 200 doenças que podem ser transmitidas dos alimentos ao homem,
através da ingestão de toxinas, bactérias e vírus. Nesses locais impróprios - e
sem registros -, há péssimas condições de higiene, onde os animais são muitas
vezes cortados em mesas ou no chão, em contato direto com quem faz o trabalho,
em meio a estruturas precárias e sujas. Nas áreas rurais o problema se torna
ainda mais latente. A equação é simples. Na ausência de órgãos fiscalizadores,
cresce a comercialização de carne cuja procedência é duvidosa. O diretor de
Sanidade Animal da Agência de Defesa Agropecuária do Ceará (Adagri), Amorim
Sobreira, explica que de acordo com a legislação vigente, não compete à Adagri
fiscalizar abatedouros irregulares ou clandestinos, mas ao serviço de
Vigilância Sanitária dos próprios municípios. A Agência fiscaliza apenas os
equipamentos que possuem o registro do Serviço de Inspeção Estadual (SIE).
Hoje, dos 43 matadouros que atuam dentro da legalidade, sete possuem esta
validação que concede o direito da livre comercialização da carne em todo o
território estadual. "Quem tem esse selo pode comercializar para outros
municípios, circular no Ceará", pontuou Sobreira.
Ainda segundo o diretor da
Adagri, o órgão só tem competência de atuar quando, por exemplo, "a carne
está em trânsito de forma irregular e os fiscais por meio de blitz conseguem
flagrar. Esses produtos são apreendidos e incinerados", acrescentou
Amorim.
Na avaliação do gestor, cabe,
portanto, aos municípios intensificarem a fiscalização para coibir a venda
irregular de carnes cuja origem é imprópria. Já o supervisionamento da
estrutura física e das condições sanitárias dos matadouros compete à
Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) e ao Conselho Regional de
Medicina Veterinária que têm o poder legal de fechar os equipamentos que
apresentam condições irregulares de funcionamento. Das 99 interdições do
Estado, a maioria foi proveniente de solicitação do Ministério Público Estadual
(MPCE).
O Ministério Público é
inclusive quem aglutina as denúncias de irregularidades. "Partimos do
pressuposto que os municípios têm o dever legal e moral de fiscalizar todos os
prédios, sejam eles particulares ou não, e fecharem aqueles que estão
irregulares. Mas, caso isso não aconteça, a própria população pode denunciar ao
MP. Este, por sua vez, aciona a Semace ou o Conselho Regional de Medicina
Veterinária", explicou o presidente da Aprece, Nilson Diniz.
Soluções
Como alternativa para reverter
esse quadro, o CRMV defende a implantação de abatedouros regionais. Um único
local ficaria responsável por atender às cidades circunvizinhas, cuja demanda
não justifica os gastos de se manter um matadouro próprio. A medida é
compartilhada pela Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece).
"As pequenas cidades não têm condições de manter um médico veterinário.
Além disso, há também outras despesas para abater três, quatro bovinos por
semana", argumenta Nilson Diniz. Ele concorda que a melhor solução é a
regionalização, "mas muitos gestores insistem em querer abrir um
abatedouro, por questões políticas, mas dificilmente terá condições de mantê-lo".
Outra medida apontada tanto
pela Aprece como pelo CRMV é a privatização das unidades já existentes. Em
Várzea Alegre, no Sul do Estado, o abatedouro foi reformado após oito anos e
entregue para a iniciativa privada. Para a gestão do Município, a medida foi
considerada correta. "Hoje, não há qualquer problema no abate, tampouco
onera os cofres públicos", pontuou o prefeito Zé Helder.
*Com informações: DN/Regional
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