Ao comentar a revogação de mais
de duas dezenas de decretos de luto oficial, Bolsonaro errou o estado de
nascimento do líder religioso Padre Cícero (1844-1934) e chamou assessores de
pau de arara. |
O presidente Jair Bolsonaro (PL)
usou na noite desta quinta-feira (03/02) uma expressão empregada para se
referir a nordestinos de forma depreciativa.
Ao comentar a revogação de mais
de duas dezenas de decretos de luto oficial, Bolsonaro errou o estado de
nascimento do líder religioso Padre Cícero (1844-1934) e chamou assessores de
pau de arara.
“Dadas as nossas revogações,
feitas há pouco tempo, falaram que eu revoguei o luto de Padre Cícero, lá de
Pernambuco”, disse Bolsonaro durante sua live semanal.
Na verdade, ele nasceu no estado
do Ceará. O presidente também cometeu outro equívoco. Entre os decretos de luto
revogados por ele, não consta o do líder religioso.
“É isso mesmo? De que cidade fica
lá?”, questionou o presidente a assessores que estavam na sala de transmissão.
“Está cheio de pau de arara aqui e não sabem que cidade fica padre Cícero?”
Auxiliares, então, responderam
Juazeiro do Norte e corrigiram Bolsonaro, apontando que o município fica no
estado do Ceará.
O termo pau de arara refere-se
aos caminhões usados na migração, em décadas passadas, de pessoas pobres do
Nordeste para outras regiões do país. Ele é usado para se referir de forma
depreciativa a nordestinos.
“Dada aquela confusão toda,
começaram, a esquerda, a oposição, [a dizer:] ‘Olha só, eu não tenho respeito
com Padre Cícero'”, afirmou Bolsonaro. Ele também disse que determinou a
reedição de todos os 122 decretos de luto —incluindo os que foram revogados por
um decreto de 1991.
No final de janeiro, a Folha
mostrou que Bolsonaro havia cancelado 25 decretos de pesar editados por seus
antecessores.
As revogações ocorreram em 2020,
como parte da política apelidada pelo Planalto de “revogaço”, propagandeada
pelo governo. Ela consiste em anular normas “cuja eficácia ou validade
encontra-se completamente prejudicada”, segundo a gestão Bolsonaro.
Em seu mandato, Bolsonaro
declarou luto oficial em apenas duas ocasiões. Na morte do vice-presidente
Marco Maciel e, mais recentemente, pelo falecimento do escritor Olavo de
Carvalho —guru e ideólogo do bolsonarismo.
Na live desta quinta, o
presidente argumentou que os decretos de luto editados no passado já não tinham
mais razão de existir. Isso ocorre porque os efeitos da norma perdem validade
tão logo termina o período do luto da pessoa homenageada.
Apesar disso, integrantes de
gestões anteriores da SAJ (Subchefia de Assuntos Jurídicos) ouvidos em caráter
reservado pela reportagem afirmam não ver sentido no cancelamento de decretos
de pesar. A subchefia é a estrutura que faz a revisão final dos atos publicados
no Diário Oficial da União.
A decretação de luto oficial é um
ato simbólico. A determinação principal é que a bandeira nacional fique a meio
mastro em todo o país durante o período de pesar.
A revogação de decretos de pesar
no governo Bolsonaro não teve tratamento igualitário para todas as autoridades
e personalidades que receberam a honraria oficial nos últimos anos.
Em um mesmo período de tempo,
foram anulados decretos de luto para determinadas pessoas, enquanto a de outras
foram mantidos. Por isso não é possível estabelecer um padrão sobre o que
motivou a inclusão na lista do “revogaço”.
Todos os decretos cancelados
foram das gestões dos ex-presidentes Itamar Franco (1992-1994), Fernando
Henrique Cardoso (1995-2002) e Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010).
Os decretos de luto oficial
cancelados abarcam uma série de autoridades, artistas, juristas e políticos
nacionais e internacionais.
Estão na lista o rei Balduíno I
da Bélgica (morto em 1993), o premiê israelense Yitzhak Rabin (1995) e o
antropólogo, historiador, cientista político e romancista Darcy Ribeiro (1997).
Entraram ainda no grupo de
decretos cancelados o luto pela morte do presidente da Câmara Luís Eduardo
Magalhães (1998), e de seu pai, senador Antônio Carlos Magalhães (2007); do
governador André Franco Montoro (1999); do economista e diplomata Roberto
Campos (2001) e do governador Barbosa Lima Sobrinho (2000).
(Folha SP)
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