Clairton Lourenço é professor da
EEM Monsenhor José Augusto da Silva -Foto: Arquivo Pessoal |
Destaque nacional nos índices de
educação, o Ceará tem apenas 41% dos professores da rede estadual concursados.
Segundo a Sinopse Estatística da Educação Básica, divulgada pelo Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), em 2023, o
Estado possuía 57% dos docentes atuando como terceirizados e outros 2%, como
CLTs.
O patamar de professores efetivos
no Ceará é o 9º menor do Brasil, empatado com o Rio Grande do Sul. Entre os
estados nordestinos, o número é o mais baixo. No Rio de Janeiro, essa parcela
chega a 96%. Já na ponta oposta, Minas Gerais tem o menor efetivo de docentes
concursados: apenas 19%.
Ao todo, 15 estados tinham mais
professores temporários que efetivos em 2023 e, ao longo da década, 16
aumentaram o número de professores temporários e diminuíram o quadro de
concursados.
A pesquisa também demonstrou a
diferença salarial entre os professores efetivos e os temporários. No Estado,
os docentes concursados ganham cerca de R$ 3,90 a mais por hora trabalhada que
os temporários. Apesar de parecer inespressivo, em dez unidades da federação
não há essa diferenciação salarial.
No Distrito Federal, a
discrepância de remuneração é a mais baixa, R$ 2,60 por hora. Já no Mato Grosso
do Sul, os professores concursados ganham R$ 26,80 a mais por hora que os
docentes temporários.
Em relação ao perfil desses
professores, o estudo mostra que a média de idade dos profissionais temporários
é de 40 anos. Entre os efetivos é 46 anos. Além disso, quase metade (43,6%) dos
temporários atua há pelo menos 11 anos como professor, o que conforme a
pesquisa, indica que esse tipo de contratação tem sido utilizada não apenas
para suprir uma demanda pontual, mas também para compor o corpo docente fixo de
algumas redes de ensino.
Perda de concursados
O número de professores
concursados nas escolas estaduais do País chegou ao menor patamar dos últimos
dez anos em 2023. Enquanto diminuem os concursados, aumentam os contratos
temporários, que já são maioria nessas redes.
O número de professores
concursados passou de 505 mil em 2013, o que representava 68,4% do total de
docentes nas redes estaduais, para 321 mil em 2023, ou 46,5% do total. Já os
contratos temporários superaram os efetivos em 2022 e, em 2023 chegaram aos 356
mil, representando 51,6% do total de contratações. Em 2013, eram 230 mil, o
equivalente a 31,1% do total.
Não há uma legislação específica
que limite o número de contratos temporários, nem há penalidades previstas aos
estados. Mas, o Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelece metas e
estratégias para todas as etapas de ensino e a valorização do setor, prevê que
pelo menos 90% dos professores das escolas públicas tenham cargos efetivos.
Essa estratégia deveria ter sido cumprida até 2017.
“Em tese, o ideal é que você
consiga suprir todo o seu quadro com professores efetivos. E a figura do
professor temporário é para suprir eventual ausência. Então, por exemplo, um
professor vai trabalhar na secretaria, você precisa de um professor temporário
para cumprir aquela carga horária. Ou ele foi afastado, readaptado, a gente
sabe que acontece esse tipo de coisa, né?”, diz o gerente de Políticas
Educacionais do Todos pela Educação, Ivan Gontijo.
“Professores temporários são
super importantes para suprir o quadro, para garantir que os alunos tenham aula
com profissionais com formação adequada, mas esse artifício da contratação
temporária deveria ser exceção à regra”, defende.
Segundo Gontijo, o estudo mostra
que o que deveria ser exceção tem se tornado regra nas redes estaduais. Essas
redes são responsáveis pela oferta de ensino médio e dos anos finais do ensino
fundamental, etapa que vai do 6º ao 9º ano.
As contratações temporárias, além
de causar impacto nas condições de trabalho dos professores, por exemplo, com
vínculos mais instáveis e salários geralmente inferiores aos professores
efetivos, podem ainda, de acordo com a publicação, interferir na aprendizagem
dos estudantes.
Valorização docente
A pesquisa destaca que três
aspectos podem explicar os possíveis impactos negativos de professores
temporários sobre os resultados dos estudantes. O primeiro deles é a alta
rotatividade docente, que pode prejudicar o vínculo com a comunidade escolar e
o efetivo desenvolvimento dos estudantes.
Além disso, os processos
seletivos utilizados pelas redes de ensino, nem sempre tão rigorosos quanto os
concursos públicos, também impactam na qualidade do ensino. Por fim, a pesquisa
aponta as condições de trabalho dos professores, que podem ser piores que a dos
efetivos.
“Essa é uma pauta muito ligada à
valorização docente. Se a gente, como país, quer valorizar os professores, não
dá para admitir alguns cenários. Como um país que quer valorizar seus
professores está dando condições de trabalho mais desafiadoras e vínculos de
trabalho mais frágeis? Por isso que é importante a gente avançar numa agenda de
solução desses problemas”, diz Gontijo.
Aprendizagem
O estudo mostra ainda possíveis
impactos na aprendizagem dos estudantes. A pesquisa utiliza os dados do Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), que medem o desempenho dos
estudantes em matemática e língua portuguesa, do 9º ano do ensino fundamental e
do 3º ano do ensino médio, etapas que ficam a cargo das redes estaduais.
Em 2019, quando resultados de
aprendizagem ainda não tinham sido impactados pela pandemia, os estudantes que
tiveram professores temporários no 9º ano obtiveram nota, em média, 3,1 pontos
menor em matemática do que os estudantes que tiveram aulas com docentes efetivos.
No ensino médio, em 2019, os estudantes que tiveram aulas com professores
temporários obtiveram nota, em média, 5,5 pontos menor em matemática e 5,6
pontos menor em língua portuguesa do que os estudantes que tiveram aulas com
docentes efetivos.
Os pesquisadores, no entanto,
fazem uma ressalva: “É importante frisar que essa análise precisa ser observada
com cautela. Ela pode ter vieses, uma vez que outras variáveis não consideradas
podem impactar o regime de contratação e a proficiência dos estudantes”, diz o
texto.
“Tem uma coisa muito importante
na educação, que é a criação de vínculos. A gente precisa disso para uma
educação de qualidade. Então, o professor conseguir construir bom vínculo com o
aluno, conseguir ter carga horária fixa de 40 horas em uma mesma escola, para
ele ter tempo para conhecer os estudantes, trabalhar de forma mais aprofundada.
Os professores temporários, em média, têm rotatividade muito maior, porque são
temporários e trabalham em mais escolas também”, diz Gontijo.
Desafios
As contratações temporárias dão
mais flexibilidade e são menos custosas para os entes federados do que as
contratações efetivas, mas elas têm também impactos, tanto para os docentes
quanto para os estudantes. Gontijo defende que garantir que concursos públicos sejam
feitos de maneira adequada é papel não apenas dos estados e municípios, mas
também do governo federal. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), Lei
9.394/1996, prevê que a União “prestará assistência técnica aos estados, ao
Distrito Federal e aos municípios na elaboração de concursos públicos para
provimento de cargos dos profissionais da educação”.
“Também há uma agenda do governo
federal, que é como o governo federal pode ajudar as redes municipais e
estaduais a fazerem mais concursos. Isso, inclusive, está previsto na LDB, que
diz que o governo federal deve ajudar as redes de ensino nos processos de
ingresso, porque sozinha as redes não estão conseguindo fazer concursos com o
tamanho e a frequência adequados. Então, o governo federal tem um papel aqui
também de apoiar as redes nos concursos públicos, para ter mais concurso
público”, afirma.
(Agência Brasil)
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